segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

As coisas são
Como não deveriam ser
Um estado



A arte desejada
Sai de fora
Para dentro
Inimputável



Preto: branco
Janela: sonho
Sonho preto: aflição diagonal
E assim vai
Não reto


O peso do argumento
Agressor
Preferível as formas
E as coisas como elas não são.



terça-feira, 24 de novembro de 2009

Coito



Te levando ao topo

Ao requisito de mais libido

Escolto teu sexo à ebulição

Em fervor de suor vivo

Me escorrego pela contração

Amando e vivendo tuas partes

Desejando a lascívia do hálito

O cheiro expresso do divino

Pondo-me junto de ti

Ansiando o toque do perfeito

O ato do tato mais devasso

Um calor interno das coxas

O arrepio instintivo de corpo doado

Repentino como o atrito dos músculos

O encaixe engrenado dos opostos

No subterfúgio do raciocínio da mente

Recebendo teu gozo puro de insanidade.


terça-feira, 10 de novembro de 2009

A ÁRVORE DA SERRA




- As árvores, meu filho, não têm alma!

E esta árvore me serve de empecilho...

É preciso cortá-la, pois, meu filho,

Para que eu tenha uma velhice calma!



- Meu pai, por que sua ira não se acalma?!

Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!

Deus pôs almas nos cedros... no junquilho...

Esta árvore, meu pai, possui minha'alma!...



- Disse - e ajoelhou-se, numa rogativa:

"Não mate a árvore, pai, para que eu viva!"

E quando a árvore, olhando a pátria serra,



Caiu aos golpes do machado bronco,

O moço triste se abraçou com o tronco

E nunca mais se levantou da terra!
 
 
 
Ausgusto dos Anjos

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Ponto

No ponto,
aponto
num ponto,
e desponto.



Daniel Monteiro

sábado, 26 de setembro de 2009

Pradarias Invisíveis

Pelo sonho caminham os peixes
O chão úmido refletia o sabor do abismo
O líquen respirando papoulas murchas

Seria a criança o limite da regalia?
Seria o carnaval a transparência dos tolos?
Viria a morte ao encontro do orgasmo?

Na geologia do pensamento há respostas
Contestadas pela célula morta
Deixadas de molho em mangue opaco
E esticadas para secar no trópico das bestas tinhosas



Onde se encaixam as pradarias invisíveis?
No mundo complexo dos cegos
Onde o âmago da vulva é tangível
E o concreto é feito de nuvens
Compartilhando o mesmo chão que os peixes
Sem tropeçar.


Daniel Monteiro

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Perfume Exótico

Quando eu a dormitar, num íntimo abandono,
Respiro o doce olor do teu colo abrasante,
Vejo desenrolar paisagem deslumbrante
Na auréola de luz d'um triste sol de outono;

Um éden terreal, uma indolente ilha
Com plantas tropicais e frutos saborosos;
Onde há homens gentis, fortes e vigorosos,
E mulher's cujo olhar honesto maravilha.

Conduz-me o teu perfume às paragens mais belas;
Vejo um porto ideal cheio de caravelas
Vindas de percorrer países estrangeiros;

E o perfume sutil do verde tamarindo,
Que circula no ar e que eu vou exaurindo,
Vem juntar-se em minh'alma à voz dos marinheiros.




Charles Baudelaire

domingo, 9 de agosto de 2009

Cana lírica

Me embebo
Me abasteço
Me enveneno.

O engenho é doce
Altiva a colheita
Poderoso o efeito.

Ardido como o sol
Libertino é certo
Abrindo o ponto de fuga.

Daniel Monteiro

segunda-feira, 3 de agosto de 2009



                                 Repartição pública fascista em Nápoles, ano 1936.

Pública


Vou publicar sobre putas
Todas as que amam clientes
Salafrárias carentes
de passarinhos políticos

É público bem como
O chamado do mendigo amarelo
Despovoando a rua abrupta
O chão seu lar, a comida crua.

Impureza chata, ingrata, sem graça                         
Não transmite nenhuma doença limpa                               
E o que se cura com a verba da massa?
Nada.

E mais público que esgoto não há
Taxado humanamente como não
Visando a engorda da república
Que acumula propinas e varizes
Também públicas
Como a via em que andamos.


Daniel Monteiro

quarta-feira, 29 de julho de 2009

"Não me importa saber como você ganha a vida.
Quero saber o que mais deseja e se ousa sonhar em satisfazer seus anseios do seu coração.

Não me interessa saber sua idade. Quero saber se você correria o risco de parecer tolo por amor, pelo seu sonho, pela aventura de estar vivo.

Não me interessa saber que planetas estão em quadratura com sua lua. O que eu quero saber é se você já foi até o fundo de sua própria tristeza, se as traições da vida o enriqueceram ou se você se retraiu e se fechou, com medo de mais dor. Quero saber se você consegue conviver com a dor, a minha ou a sua, sem tentar escondê-la, disfarçá-la ou remediá-la.

Quero saber se você é capaz de conviver com a alegria, a minha ou a sua, de dançar com total abandono e deixar o êxtase penetrar até a ponta dos seus dedos, sem nos advertir que sejamos cuidadosos, que sejamos realistas, que nos lembremos das limitações da condição humana.

Não me interessa se a história que você me conta é verdadeira. Quero saber se é capaz de desapontar o outro para se manter fiel a si mesmo. Se é capaz de suportar uma acusação de traição e não trair sua própria alma, ou ser infiel e, mesmo assim, ser digno de confiança.

Quero saber se você é capaz de enxergar a beleza no dia-a-dia, ainda que ela não seja bonita, e fazer dela a fonte da sua vida.

Quero saber se você consegue viver com o fracasso, o seu e o meu,e ainda assim pôr-se de pé na beira do lagoe gritar para o reflexo prateado da lua cheia: "Sim!"

Não me interessa saber onde você mora ou quanto dinheiro tem. Quero saber se, após uma noite de tristeza e desespero, exausto e ferido até os ossos, é capaz de fazer o que precisa ser feito para alimentar seus filhos.

Não me interessa quem você conhece ou como chegou até aqui. Quero saber se vai permanecer no centro do fogo comigo sem recuar.

Não me interessa onde, o que ou com quem estudou.Quero saber o que o sustenta, no seu íntimo, quando tudo mais desmorona.

Quero saber se é capaz de ficar só consigo mesmo e senos momentos vazios realmente gosta da sua companhia."
Oriah
Índio Sonhador da Montanha

terça-feira, 21 de julho de 2009

Cavalos e Almas


O cheiro do mato aberto
Remete às casas senhoriais
E a poesia sai atônita,
Agalopada,
Desrespeitosa.

Hoje os eqüinos são receosos do homem
Domesticados sem livre arbítrio
Sem genitais e desejo próprio.

É feio essa ranhura domada
Esse sintoma de domínio
Esse coice na selvageria
Correto na sua mentira.

Como vamos decidir
Pra onde vai as almas
Se não sabemos ser justos
Com seres horóscopos

A alma ricocheteia internamente
Inquietando o cavalo no pasto
Reverberando a vontade dominante
O estirar supremo do músculo


Transparente,
Ressabia o canto do espírito
O instinto de um ser livre
O olhar através do descampado

O antílope brinda o peito ao vento
Mastiga a verdura do sustento
Ama o correr desembaraçado do fim-tarde
Pelos certos pedregulhos
Investindo moral

Tal nobreza cega o domador
Vendo o poderio do servidor
Cala consentindo a força
Deixando-se guiar com animal vigor.


Daniel Monteiro